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Justiça do Trabalho lança Política Judiciária Nacional de Trabalho Decente

Ela ampliará os programas da Justiça do Trabalho para abranger questões de equidade e diversidade, tráfico de pessoas e proteção a migrantes

3/8/23 – O presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e do Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), ministro Lelio Bentes Corrêa, lançou, nesta quarta-feira (2), a Política Judiciária Nacional de Trabalho Decente. A proposta é uniformizar, racionalizar e automatizar procedimentos e processos necessários ao aprimoramento da Justiça do Trabalho e ampliar o acesso à justiça. O anúncio foi feito no segundo dia do Seminário Trabalho Decente, no TST.

A Política será constituída por dois novos programas: “Equidade de Raça, Gênero e Diversidade”, coordenado pela ministra Kátia Arruda, e “Enfrentamento ao Trabalho Escravo, ao Tráfico de Pessoas e de Proteção ao Trabalho do Migrante”, coordenado pelo ministro Augusto César. Eles se somarão aos programas “Trabalho Seguro” e de “Combate ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem”.
 
De acordo com o presidente, a Política será de caráter contínuo, com o objetivo de impulsionar o desenvolvimento, pelos Tribunais Regionais do Trabalho e pelo TST, de programas, projetos e ações voltadas à implementação do trabalho decente, em consonância com a estratégia nacional da Justiça do Trabalho. 

Carta de Trabalho Decente

O ministro Evandro Valadão, coordenador nacional do Programa de Combate ao Trabalho Infantil e de Estímulo à Aprendizagem, fez a leitura da “Carta da Política de Trabalho Decente – proposições para a construção de uma agenda de saúde, segurança, equidade, proteção à infância e erradicação do trabalho infantil“. “Que nós, do sistema da Justiça do Trabalho, possamos efetivamente contribuir para um mundo melhor e promover efetivamente o trabalho decente, a dignidade da pessoa humana e  a compaixão”, afirmou.
 
O ministro Mauricio Godinho Delgado, diretor da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho (Enamat),  destacou a presença do Judiciário trabalhista nos contexto dos temas mais importantes dos direitos humanos. “A Justiça do Trabalho é um instrumento fundamental de afirmação de todos os seres humanos, e o foco do seminário é a proibição do trabalho na fase de formação e desenvolvimento do ser humano desde a infância até a adolescência”, comentou.

Fábrica clandestina

No lançamento dos programas, o presidente relembrou o caso da explosão de uma fábrica clandestina de fogos, no Recôncavo Baiano, que, em 1998, matou 64 pessoas, a maioria mulheres e crianças negras, para reforçar a importância da atuação do Estado brasileiro na promoção do trabalho decente. O caso expôs as precárias condições de trabalho às quais as vítimas eram expostas e gerou a condenação do Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) por graves violações de direitos humanos. Ana Maria Balbina e Rosa Rocha, trabalhadoras da fábrica e presidente e vice-presidente do Movimento 11 de Dezembro, participaram do seminário.

Normatização internacional

No segundo dia do evento, os participantes acompanharam painéis com juristas e especialistas do Brasil e do exterior, além de participar de oficinas.

Desenvolver boas condições de trabalho é uma preocupação mundial. Para consolidar normas que sejam de alcance geral, a ONU tem uma agência específica. Criada em 1919, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) é responsável pela formulação e pela aplicação de recomendações e convenções, que devem ser ratificadas pelos países para integrar parte de seu ordenamento jurídico. 

“O trabalho está para servir o homem e não o contrário”, afirmou o ex-diretor da OIT Jean Michel Servais sobre a importância da agência e o avanço das regulações internacionais. Ele defendeu a necessidade de uma reorganização atual do trabalho com viés mais social, principalmente após a pandemia. “Há urgência em repensar uma organização do trabalho do ponto de vista humano, de dispor de um marco jurídico e de um sistema de proteção social amplificado”, afirmou.

O ministro Alberto Balazeiro posicionou como questão central dessa discussão a realidade em que muitos países e empresas ainda compreendem saúde e segurança no trabalho como custos, e não como investimento. 

Responsabilização empresarial

Para a advogada especializada em direitos humanos e direito internacional Victoriana Gonzaga, isso só será atingido a partir do desenvolvimento de uma conduta empresarial responsável em toda a cadeia de fornecimento. “É muito comum as empresas alegarem que não estavam envolvidas, que se trata de empresa terceirizada”, observou.
 
Ela alerta para a inclusão dos direitos humanos na cadeia de valor produtiva. ”É uma agenda de responsabilização dessas empresas internacionalmente para além de implementação de padrões de conduta e responsabilidade”.

Subnotificação

O desafio na esfera do trabalho decente abarca também o trabalho infantil. São 168 milhões de crianças trabalhando no mundo, conforme o pesquisador e professor da Universidade de Zurique (Suíça) Guilherme Lichand. 

Em sua apresentação, ele destacou a dificuldade de mensuração e explicou que, na prática, a OIT harmoniza os dados coletados pelos diferentes países (às vezes pelo Banco Mundial, às vezes pela Unicef, às vezes pelo próprio governo) sob uma mesma metodologia. Mas, segundo Lichand, o problema é a subnotificação, já que quem responde às pesquisas é um adulto, normalmente os pais, que temem retaliações no trabalho ou do próprio governo ao assumirem o trabalho das crianças. 

Criança de rua 

O contexto social também interfere, segundo a secretária executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI), Katerina Volcov. Pela perspectiva da desigualdade social e da pobreza, as crianças ainda são invisibilizadas e privadas de capacidades básicas. 

Para ela, o investimento público na primeira infância é essencial para coibir o trabalho infantil e a vulnerabilidade das crianças. “Preconceitos, questões de gênero, acesso a crédito, acesso a emprego e renda, fazem parte de uma injustiça epistêmica”. 

Inclusão Social

O último painel foi apresentado pelo magistrado Sérgio Javier Molina, do Conselho da Judicatura Federal do México, que falou sobre acesso à Justiça e inclusão social. Ele discorreu sobre o constitucionalismo social e os períodos econômicos, sociais e políticos do direito do trabalho no México. Também abordou os acordos comerciais com os Estados Unidos e com o Canadá, a legislação laboral e o modelo de administração da justiça. 

“Acabar com o trabalho infantil, evitar a discriminação no trabalho, erradicar o trabalho forçado, fomentar a livre contratação coletiva, enaltecer a liberdade sindical e garantir da melhor maneira a segurança social é a nossa carta de navegação do que, em conjunto, podemos chamar de trabalho decente”.  

(Lara Aliano e Nathália Valente/CF)

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